quinta-feira, 10 de maio de 2012

O INIMIGO MORA AO LADO


 Este é um ano de eleições no Brasil. É o tempo em que políticos fazem conchavos e os partidos não vêm fronteiras ideológicas nas suas coligações em busca do poder. Passada a fase de comemorações de vitórias e de loteamento de cargos, as vezes, surgem discordâncias, queixas, ciúmes e outras mazelas que costumam terminar em afastamentos, ressentimentos e inimizades. A história registra casos de “uniões ideológicas inabaláveis” que terminaram em encomendas de assassinatos, golpes de estado, acidentes inexplicáveis, tiros e facadas. Quer dizer: quem tem certos amigos, pra quê inimigos?
 Na antiga União Soviética, por exemplo, o premier – entre 1955 e outubro de 1964 – Nikita Kruchov era afinadíssimo com dois membros do Politiburo, Leonid Brejnev e Nikolai Podgorny, e com o ideólgo do Kremlin, Mikhail Suslov. Pra completar, ainda tinha o apoio de Vladimir Semichastny, o chefe da KGB (polícia secreta) e de Alexander Shelepin, secretário do Partido Comunista. Estava mais do que seguro como líder soviético.
 Fortalecido por romper relações diplomáticas com a China, de Mao Tsé Tung; libertar presos políticos; construir o Muro de Berlim; esmagar a tentativa da Hungria, de deixar o bloco soviético, e por denunciar os abusos de poder de Joseph Stálin, o líder Kruchov levou uma autêntica rasteira dos “amigos”. Acusado de erros, como nepotismo, decisões precipitadas, conclusões pueris e  má administração da economia, passou a ser considerado um autêntico “vacilão” e foi obrigado a “renunciar voluntariamente”, para três “chegados” dividirem o poder: Leonid Brejnev, Alexei Kossiguin e Nikolai Podgorny. Pra arrematar:  Kruchov foi retirado da história do PC soviético e  terminou seus dias – setembro de 1971 – como um ilustre esquecido. Precisava de certos camaradas?
Mao muito mau – Entre 1966 e 1976, a “Grande Revolução Cultural Proletária”, proposta pelo Partido Comunista da China, para a República Popular do país, vivia intensas turbulências política e social.   O “Grande Salto Adiante”, pregado pelo líder Mao Tsé Tung, dera pra trás e lhe enfraquecera, fortalecendo dirigentes como Deng Xiaoping e Liu Shaoshi, e aproximara os grupos de Lin Piao e Xiang Xing. De repente, uma tremenda luta pelo poder instalou-se dentro do Comitê Central do PC chinês.
 Habilidoso, Mao Tsé Tung acusou o partido do governo, o exército e a vida cultural chinesa de abrigarem representantes da burguesia, e conclamou as massas ao expurgo total dessa legião. Mas, como a economia ia mal e o caos social era insuportável, no meio de julgamentos e fuzilamentos, foi preciso o Exército Nacional de Libertação restabelecer a ordem, o que enalteceu  Lin Piao, o compilador do “Livro Vermelho”, de citações ideológicas de Mao, e promotor do culto à personalidade do “amigo líder”, dentro do Exército Vermelho.
  Nomeado, pelo Congresso Nacional do PC chinês, como  sucessor de Mao, na liderança do partido, a movimentação política de Lin Piao levou Tsé Tung a ver o “parceiro” armando um golpe. Resumo da ópera: “morreram” com Lin Piao, em um misterioso desastre de avião, em 1971. Quanto a Mao, ele não estava mais vivo – em setembro de 1976 – quando Deng Xiaoping mandou prender toda a sua curriola e, de quebra, matou a sua Revolução Cultural – amizade diferente.
Presente de grego – O coronel George Papadopoulos era  “amigão” do Rei Constantino e do premier Georgios Papandreou, que deveria ser reeleito, em maio de 1967, por uma coalizão de centro-esquerda. Só que, antes disso ocorrer, Papadopoulos decidiu que ele deveria rever certas amizades e livrar a Grécia de um futuro comunista.
 No dia 21 de abril daquele 67, o coronel acabou com a monarquia constitucional do país e, durante sete anos, oferceu aos gregos a primeira ditadura totalitária européia do pós-guerra. Em dezembro, como presente de Natal, Papadopoulos presenteou-se com o cargo de primeiro-ministro, e transformou o amigo e general George Zoitakis em regente. Só exagerou um pouquinho: proibiu o uso da minissaia, dos cabelos longos e das canções de protesto no país. Bobagem para quem mandou prender 45 mil ex-amigos, entre eles Papandreou, que viveu em prisão domiciliar, “até partir desta para uma outra melhor”, em 1968.
 Em 1971, porque Papadopoulos mandara soltar os ex-amigos, o rei achou que dava pra encarar a ditadura, no ano seguinte. Se deu mal. O coronel proclamou a república, organizou um plebiscito e saiu dele presidente, primeiro-ministro, ministro do exército e regente da monarquia. Só que o ditador esqueceu-se de administrar egos. Seus “amigos” de ditadura começaram a se desentender, e se desentenderam também com ele. Resultado dos desentendimentos: golpearam o golpe de Papadopoulos, em 1973. Afinal, mesmo no berço da democracia, é pra golpear que servem os amigos golpistas.               
PRIMAVERA DE TANQUES -  O secretário-geral do Partido Comunista da então Tcheco-Eslováquia, Alexandre Dubcek, via-se bem afinado com seu “chefe”, Leonid Brejnev, o líder soviético que mandava em todo o leste europeu, graças a um acordo pós-guerra chamado Pacto de Varsóvia. Para Dubcek, obedecendo à política externa do “camarada” e caprichando no quesito defesa militar, seu governo seria eterno.
 No entanto, bastou a Dubcek tentar modernizar o seu socialismo, com reformas políticas, econômicas e culturais, em 1968, para o “amigão” Brejenev mandar 650  mil soldados lhe deixarem quietinho.  O líder soviético lotou as ruas de Praga, com tanques de últimos modelos, e fez do chefe do governo tcheco “hóspede” oficial do Pacto de Varsóvia – atrás das grades. Também, quem mandou ser surdo? Se ouvisse melhor, Dubceck não perderia “amigos” e se lembraria que Moscou não aceitava desvios ideológicos.  
AMIZADE FARAÔNICA – Os soviéticos tinham, também, isto é, pensavam que tinham, grandes amizades em outras plagas. Caso dos complicadinhos egípcios. Em julho de 1972, o presidente Anwar Sadat achou que suas “amizades” moscovitas interferiam demais nos negócios do seu país, e não perdoou uma negativa de pedido de armamentos, ante a constatação de que os Estados Unidos armavam, cada vez mais, o inimigo Israel, detentor de absoluta supremacia militar no Oriente Médio, desde sua vitória, sobre os árabes, na Guerra dos Seis Dias, em 1967.
 Ciente de que o Kremlin estava muito mais interessado em transformar Marx e Engels em inquilinos por aquelas bandas árabes, e não poderia contar com Moscou, no caso de uma nova guerra contra os israelenses, Sadat mandou pro “País Que Pudesse” mais de 15 mil “ex-amigos” soviéticos, entre técnicos e conselheiros militares emprestados pelos “ex-camaradas” da CCCP, – por falta de camaradagem, mumificou a “amizade”.         
Sujaram o lorde –  Jornalista – dos bons –, o inglês Winston Leonard Spencer Churchill, “nas horas vagas”, digamos, costumava lutar em guerras. Isso quando não as estava cobrindo, para os jornais londrinos, como a da libertação de Cuba (do domínio espanhol), em 1895. Aos 25 anos de idade, o baixinho já havia pegado em armas durante quatro grandes conflitos.
 Pois bem! Durante a primeira Guerra Mundial, em 1914, Churcill era o primeiro lorde do almirantado britânico. No segundo grande conflito, em 1940, ele já estava no poder,  na Inglaterra. Bom de copo e melhor ainda de fumo (consumidor compulsivo de charutos), Curchill comando a resistência inglesa contra a Alemanha nazista de Adolph Hitler, desconsiderou ideologias e alisou-se à Moscou. Aquilo mobilizou os Estados Unidos e matou a guerra. Beleza! Ótimo para o futuro político de Winston Leonard Spencer? Que nada! Seus “amigos” eleitores não o reelegeram.
Sacanagem pouca é bobagem, já dizia o poeta.   Ainda antes do cessar-fogo entre nazistas e aliados – quem tinha aqueles aliados não precisava desalinhar –  os “amigos” de Churchill esqueceram de lembrar que, sem o homem que bebia todas (wiskie de boa qualidade, diga-se de passagem), o mundo jamais poderia ser dividido entre interesses de Moscou e de Washington, durante as conferências de Ialta e Potsdam –  literalmente, “incluíram Londres fora dessa”. Logo, quem tem certos amigos...
                          

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